sábado, 3 de janeiro de 2009

Homem de lata

O Homem-de-lata afunda a pata no acelerador de sua caranga de carne-e-osso. Avança sobre o centro nervoso da cidade desalmada afim de lançar o coração como granada. A missão cumprida lança-o à rotina. Homem-de-lata envasa à direçao de sua casa num vôo propulsionado a tapa na nuca, cascudo na carapinha, movido a preguiça - como que içado pelos pentelhos de bombril por uma pinça. Estaciona na garagem do prédio de carne-e-osso. Senta-se no sofá de fígado e abrindo uma latinha de sangue estupidamente barato encrosta-se na sua tv de cartilagem plana. Dorme homem-de-lata, dorme. Adentra essa mata de fibra ótica sob este céu de fusíveis. veja como é belo o mar de gasolina quebrando nos bytes da praia. Sonha homem-de-lata, sonha. O que não te fortalece te mata. Há de haver um lugar onde a vida é só aço, madeira, ferro, plástico. O mundo é também dos que apenas sonham que podem conquistá-lo. Homem de lata, acorda sobressaltado. Onde haverá pedra neste mundo, pensa, estou farto de semi-máquinas. Senta-se à escrivaninha de gordura e, lembrando-se do amanhã, escreve em seu notebook de estrias:

"Rio de janeiro. Menos 20 graus. Os patinadores cavalgam parelhos no espelho de gelo da lagoa. O Cristo Redentor, quase irreconhecível assim, com a neve cobrindo-lhe o dorso das mãos, pés, braços, ombros, cabeça... não fosse a justa localização e tamanho poderia se suspeitar que fosse outrem ali: Um king-kong petrificado no apogeu da escalada; uma esfinge, de pé, propondo a pantomima de seu enigma; a Estátua da Liberdade - renunciando à tocha, os braços semi-erguidos como asas, livre; quiçá a Torre Eiffel obesa ou mesmo um patético espantalho gigante afugentando o sol... queda lentamente escorada pelo absoluto silêncio, este silêncio hibernado há mais de 500 anos, lapidando as hélices dos flocos para o desbunde branco. Casais sobre esquis descem o Pão-de-Açucar. Na Baía de Guanabara vê-se um pai que puxa o filho num trenó. Pingüins aplaudem a aurora boreal no Posto 9. Vai mesmo que o Pau-Brasil cisma de desbotar na Polônia e uma ave gargarejar na Rússia! Uzbequistão e suas palmeiras do mangue... Sibéria, 40°. Hoje, aqui, são as neves de março que fecham o verão. E promessa nenhuma. Nunca mais."

(Michel Melamed)

8 comentários:

  1. Lina, mascotinha! Onde tu achaste esse tesouro?
    Que texto magnífico. Nossa... profundíssimo e digno de uma análise.
    Por falar em análise, cada postagem de poesia deveria ter tal fim. Cada Borboletinha deveria interpretar a leitura de cada texto. Não achas?

    Bom, aí vi a minha interpretação, em quatro palavras: O avesso do mundo.
    Mas, por que não "O mundo de cabeça pra baixo?"
    No texto, os valores são trocados. Tudo está invertido.
    Os seres humanos trocaram de constituição com os objetos. O que era pra ser de lata, madeira, plástico é de gordura, estria, fígado. E vice-versa.
    O impossível parece acontecer. Regiões quentes, viram gelo, enquanto lugares gelados derretem de tanto calor.
    Mas, não seria para isso que o mundo, hoje, está se encaminhando? Talvez. A COISIFICAÇÃO do homem é algo alcançável a nossos olhos. O ser humano está deixando de ser Humano. Transforma-se cada vez mais em objeto de outros, em máquinas. Tudo tão anti-humano, tão DESumano. Hoje, o homem não vive, trabalha. Hoje o homem não descança, aciona o botão "desligar". Hoje, o homem não interpreta, raciona. Hoje, o homem não tem mais vida social, não conversa, não fala, nem ouve. Apenas obedece aos comandos de certos "botões" instalados em seu sistema operacional (claro, cérebro não existe mais).
    Além disso, pode o homem ser amassado, chutado, rasgado (tal como uma lata). Está assim, à mercê de uma sociedade coisificada.
    Tudo por causa de uma vida tão corrida, tão mesquinha, tão fútil e tão obediente a certas transformações maquinárias.
    O homem se transformou em lata, em máquina.

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  2. Em relação à inversão climática das regiões, acredito eu que o homem tem em parte culpa nisso.
    O homem é responsável por transformções absurdas do meio em que vive. O homem destrói, derruba, arruina. O meio natural vai se esvaindo diante de tanta intervenção humana.
    E aí? Florestas viram desertos e de desertos viram vias, estradas, prédios, fábricas. Oxigênio vira gás carbônico, a camada de ozônio vira buraco. E os raios de Sol? Queimam cada vez mais. E o gelo? Vira água corrente.
    Tudo vai se transformando e ficando assim, de cabeça pra baixo.
    Perto dali um homem, aliás uma lata, uma máquina assiste tudo com satisfação, aplaude até. Esse homem-lata pode até ser amassado e machucado por outros homens-lata, mas nada do que ele destrói ou transforma é capaz de lhe ferir um arranhão que seja. E, então, ele aplaude.
    E assim caminha a Humanidade (Humanidade?). Trocando valores, invertendo o jogo. Destruindo.
    Quem sabe um dia o Planeta não tome a forma cilíndrica de uma latinha de refrigerante?
    Isso. Além da forma alterada, o material também. E será assim, a Terra será perfeita nos olhos de quem a vê. Feita de lata, igual ao homem e transformada pelo mesmo homem.
    INFELIZMENTE.

    Beijos,
    Aninha

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  3. A coisificação é constante, a inversão de valores é notavél...
    O homem vem valorizando tudo menos o seu próximo
    Fica em nós perguntas
    o que vale mais os meus bens ou a vida de um amigo??
    O dinheiro ou o amor?
    O homem perdeu a maioria dos seus sentimentos nos tornamos pessoas frias coisificadas, verdadeiros Homens de Lata...
    ahh a nossa natureza(ou a parte dela que restou) é toda desvastada não respeitando a fauna, a flora...
    O que podemos ver é só destruição por todos os lados..
    O que me deicha mais triste é que quase ninguem se importa
    BY Lina

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  4. Oi aninha...
    essa mascote corre atrás
    procurando em sites poesias para postar..
    eu salvei um monte pra ir postando
    ai a Jess me pediu q postase logo essa
    ai fui nos meus arquivos e postei...
    bjuss
    amo oxê
    ^^

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  6. Tudo q eu ia dizer já foi dito...

    perfeito!!

    Homem de lata. Será esse o nosso futuro??

    Bjs Melamídicos!

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  7. Só pra ressaltar, os dois primeiros comentários são meus. Lina tinha ficado em dúvida.
    Devia ter colocado "continuação". Rss!

    Beijos,
    Aninha

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  8. ô num entrega q euu so MOl rede nacional..rsrsrsr
    bjusss

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